Arquivo mensal: agosto 2014

O cérebro (e a vida) dos adolescentes

 

Coral cérebro, que fotografei ao mergulhar em Abrolhos

Coral cérebro, que fotografei ao mergulhar em Abrolhos

Dizer que os adolescentes são “aborrescentes” é limitar nossa visão a respeito dessa fase do desenvolvimento que abre novos horizontes de descobertas, experimentação, criatividade, ousadia. Essa visão preconceituosa dos adolescentes como pessoas complicadas, incomodamente questionadoras que adoram tumultuar a ordem estabelecida nos impede de estabelecer com eles uma relação de entendimento e aprendizagem recíproca, aprofundando o abismo do “conflito de gerações”.

Dan Siegel, um psiquiatra americano que trabalha com a neurobiologia dos relacionamentos, diz que nosso cérebro é um órgão social. Nascemos para nos vincularmos com os outros, e a qualidade dos vínculos que construímos no decorrer da vida influencia nossa arquitetura cerebral. Em seu livro sobre as mudanças do cérebro na adolescência, mostra que o desenvolvimento do córtex pré-frontal conecta o córtex com o sistema límbico e com o tronco cerebral. Tem função integradora, que promove a saúde emocional.

No adolescente, essa função da integração é o principal marco do desenvolvimento cerebral. Com a integração, atingimos um novo patamar de desenvolvimento. Por isso, o córtex pré-frontal (que alguns autores definem como “gerente geral do cérebro”) é tão importante. Remodela o cérebro para continuar o desenvolvimento até a juventude. Quanto mais integrado o cérebro, maior a harmonia e a resiliência da pessoa.

No entanto, na adolescência, é frequente a exposição a riscos, que aumenta a propensão a acidentes. As taxas de homicídio e suicídio também são significativas nessa faixa etária. Apesar do desenvolvimento gradual do córtex pré-frontal, o sistema límbico é mais influente: torna-se difícil controlar as emoções. Boa parte dos adolescentes reage a comentários neutros como se fossem hostis, agem de modo impulsivo e explosivo. Por outro lado, os adolescentes se apaixonam por pessoas e ideias, intensificam o engajamento social. É grande a influência do grupo de amigos para desafiar os riscos e também para colaborar.

Nessa fase da vida, o cérebro é motivado por novidades, devido às mudanças no sistema da dopamina. Os adolescentes facilmente se entediam, anseiam por novas experiências, testam os próprios limites e, por isso, correm riscos, apesar de serem bem informados. Acham que vai dar tudo certo: o perigo é para os outros, não para eles próprios.

Quando famílias e educadores conseguem ver a adolescência como uma época fantástica de desenvolvimento, descobrem caminhos de conversa reflexiva e transformam situações de conflito em possibilidades de aprofundar a conexão, o entendimento recíproco e a colaboração.

Referência: Dan Siegel, The power and purpose of the teenage brain, ed. Tarcher,NY, 2013.

“Meu filho se alimenta mal!”

Mercado que fotografei em Londres

Mercado que fotografei em Londres

A conversa com um grupo de educadoras e fonoaudiólogas foi muito produtiva, passando por temas que mais chamam a atenção no contato entre professores, alunos e suas famílias.

Começamos pela incoerência dos adolescentes da “geração saúde” que querem alimentos orgânicos, sem glúten e refeições balanceadas mas, para esculpir um corpo “sarado”, recorrem a anabolizantes e, para enfrentar a timidez e “entrar na onda”, abusam do álcool nos programas de finais de semana e nas festas (há as que incluem uma ambulância na porta, para atender os jovens que se excederam na bebida!). Famílias que se preocupam com a ingestão de álcool acham difícil controlar o acesso à bebida quando seus filhos adolescentes vão para a “pré-festa” na casa de amigos cujas famílias liberam o bar.

Com as crianças, vemos modos diferentes de lidar com a questão da alimentação. As famílias que batalham pela criação de bons hábitos alimentares não permitem que as crianças levem, para o lanche escolar, doces, refrigerantes ou salgados com corantes, gorduras e baixo teor nutritivo. Com o troca-troca das merendas, a criança da “comida saudável” fica excluída e tentada a pegar as migalhas que sobram das “porcarias” dos lanches dos colegas. Por outro lado, as crianças cujas famílias não se preocupam com a diversidade de alimentos necessária para o bom crescimento, podem apresentar deficiências nutricionais que prejudicam inclusive o rendimento escolar.

O ato de se alimentar é carregado de conteúdos emocionais. A dupla mãe-bebê bem sintonizada na amamentação transmite à criancinha o prazer do alimento que sai do corpo materno, a sensação de segurança e de aconchego. No desmame, a gradual introdução de novos alimentos pode estimular a curiosidade para descobrir novos sabores e texturas. As famílias que relutam em deixar a criancinha brincar com o alimento (porque faz muita sujeira ou pelo receio de que acabará comendo pouco) restringem a autonomia, a curiosidade e a riqueza sensorial (sentir nas mãos texturas diferentes, cheirar a comida, introduzir o alimento na boca com as próprias mãos).

Essas restrições ou a pressa de dar as refeições para a criança por conta da falta de tempo podem criar resistências e inibir o prazer de comer. A criança vai criando barreiras, recusando vários tipos de alimentos e, com isso, instalam-se tensões e conflitos com a família.

Os jogos de poder encontram terreno fértil e, quase sempre, a criança percebe que é vencedora porque consegue preocupar ou exasperar os adultos quando se recusa a comer. Estes recorrem a chantagens, promessas, castigos. Em vão. Ou se rendem à tirania da criança, que exige que a comida seja feita como ela quer e até obriga os adultos a deixá-la comer vendo TV, ouvindo histórias ou correndo pela casa. Curiosamente, essa mesma criança pode comer bem na casa de outras pessoas ou na escola.

Quais são os hábitos alimentares da família? Como se organizam os horários das refeições? São momentos de encontro e de contato, ou cada um come sozinho em seu canto? Comumente, algumas mudanças na rede das relações familiares resulta em mudanças expressivas no comportamento da criança com relação à alimentação. Afinal, alimentar-se bem é um aspecto fundamental da aprendizagem de cuidar bem de si mesmo.

Na tela da fantasia

Uma bela escultura que fotografei em Inhotim (MG)

Uma bela escultura que fotografei em Inhotim (MG)

Ao reler O menino do espelho, de Fernando Sabino, após ver o filme, apreciei a mescla entre lembranças da infância e ficção na narrativa desse escritor “que nasceu homem e morreu menino”. Histórias de uma época em que as telas da TV, do videogame, do iPad e do celular ainda não existiam para roubar espaço da tela da fantasia.

Do livro: “Descalço, pouco me incomodando com a lama em que meus pés se afundavam, gostava de abrir regos para que as poças d’água, como pequeninos lagos, escorressem pelo declive do terreiro, formando o  que  para  mim  era  um caudaloso  rio.  E me distraía fazendo descer por ele barquinhos de papel, que eram grandes caravelas de piratas”.

Ken Robinson, na palestra TED “Como as escolas matam a criatividade”, diz que o mundo precisa cada vez mais de pessoas criativas e inovadoras. E afirma que estimular a criatividade é tão importante quanto alfabetizar. Cita Picasso, que acreditava que todas as crianças são artistas, e questiona: Por que não ensinar dança com a mesma ênfase dedicada ao ensino da matemática?

Quem não está preparado para errar não consegue ser ousado para criar, e as escolas convencionais não lidam bem com o erro. Ken Robinson argumenta que, em geral, as escolas estão voltadas para preparar os alunos para a universidade. Os que são muito criativos se sentem peixes fora d´água no contexto da escola convencional. Porém, com a proliferação das universidades, cresce o número de pessoas com diplomas que não encontram emprego. É preciso questionar alguns dos princípios fundamentais da educação.

Lee Iacocca, considerado como um dos mais competentes CEOs do mundo, afirma que a capacidade de liderança pode ser aprendida. Como características principais do líder eficaz, destaca: curiosidade, criatividade, coragem para sair da “zona de conforto” e gerar ideias “fora da caixa”, capacidade de se comunicar com clareza, habilidade para gerenciar crises. As crianças pequenas são espontâneas, curiosas e criativas. É imensa a responsabilidade da parceria família-escola no sentido de estimular a expansão dessas características, em vez de tolhê-las em currículos engessados e em sucessivas tentativas de enquadrá-las nos moldes convencionais do “é assim que deve ser”.

Referências:

Sabino, Fernando. O menino no espelho, Rio de Janeiro: Ed. Record.

TED Talk com Ken Robinson – How schools kill creativity em:

https://www.ted.com/playlists/171/the_20_most_popular_talks_of_a?awesm=on.ted.com_s01RX&utm_source=direct-on.ted.com&utm_medium=on.ted.com-twitter&utm_content=awesm-publisher&utm_campaign=

Iacocca, Lee and Catherine Whitney.   Where Have All the Leaders Gone?   New York: Scribner, 2007.

Limites são necessários em todas as idades!

Fotografei no voo pelos Lençóis Maranhenses.

Fotografei no voo pelos Lençóis Maranhenses.

Há pais que confessam que não conseguem colocar limites. Dizem que os filhos simplesmente os ignoram e continuam fazendo o que querem. Por medo de serem autoritários, sentem dificuldade de exercer autoridade. No entanto, na aprendizagem do respeito pelos outros, é essencial que os limites sejam colocados com clareza, paciência e persistência, juntamente com as respectivas consequências. Estas serão aplicadas sempre que os “combinados” não forem cumpridos.

Limites claros, consistentes e colocados no momento certo ajudam crianças e adolescentes a lidar com as frustrações, a ter consideração e respeito pelos outros, a pensar alternativas possíveis, desenvolvendo a criatividade e a inteligência social.

Nos primeiros anos de vida, vivemos na lei do desejo: “Eu quero agora!”. Pouco a pouco, aprendemos a viver na lei da realidade: “Nem sempre tenho tudo que quero, na hora ou do jeito que eu desejaria”. Passamos a perceber a existência e o direito dos outros, aprendemos a fazer acordos.

No decorrer de toda nossa vida, precisamos fazer escolhas e renúncias, desenvolvendo a autodisciplina, buscando o equilíbrio entre deveres e prazeres. Para construir o freio interno, é preciso contar inicialmente com o freio externo representado pelos limites colocados no âmbito da família e da escola, junto com suas respectivas consequências, até que sejamos capazes de, autonomamente, colocar os limites necessários para nós mesmos. Essa competência nos permite, por exemplo, desenvolver disciplina financeira para não nos endividarmos, evitar a ingestão excessiva de comida ou de bebidas alcóolicas e muitas outras ações que revelam a capacidade de cuidar bem de nós mesmos.

Quando aprendemos a tomar conta de nós mesmos

Ninguém precisa ficar mandando na gente!

Não adianta ficar reclamando da cobrança

Se não faz a sua obrigação

E nem quer ter responsabilidade

Para ser livre é preciso saber se organizar

Quando não deixa tudo pra depois

Sobra muito mais tempo pra brincar!

CONVERSA EFICAZ

2014-08-01 12.12.34

Essa é uma das músicas que compus para trabalhar o tema da gestão de conflitos. Com a escuta atenta e respeitosa, ampliamos nosso olhar sobre o problema que queremos resolver:

Em vez de colocar a culpa nos outros

Melhor pensar em nossa contribuição

Em vez de julgar o certo e o errado

Melhor tentar sair dessa confusão

Partindo de histórias muito diferentes

Vamos criar uma história em comum

Que nos ajuda a ter um olhar maior

E assim gerar uma conversa eficaz!